17 de novembro de 2008

chorar é preciso. ser feliz não é preciso.

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- Até quando é preciso segurar as lágrimas ou tentar escondê-las, virando o rosto e enxugando as gotinhas na manga da blusa o mais rápido possível?



Uma ilusão, isso é tudo o que nos tornamos. Escondendo o que realmente somos atrás de uma efígie de força, personalidade, confiança. Frágeis, carentes, sensíveis e suscetíveis – alguém que não gostaríamos de ser.

Chorar é preciso. Caem as lágrimas, caem as máscaras. Desnuda-se a alma, revelando medos e fraquezas. Chorar dói. A verdade dói. Quando não é mais possível manter as aparências, aceitar o que realmente somos é um exercício de fé. Apesar de, chorar é preciso. Alivia o fardo de ser. É a sangria da alma.

Ser feliz não é preciso. Aos olhos do mundo, o sorriso e a calma são dádivas. Na cegueira da consciência, a alegria é apenas um meio de viver em sociedade. Ninguém é obrigado a ser feliz. Ninguém deve ser feliz, se de fato não o for. Ser, plena e genuinamente. Ser, independente do que seja. Ser - só o que somos.

Viver é, talvez, uma responsabilidade maior do que é possível honrar. Impossível?
Finge-se ser. Finge-se viver. Alguns muito bem.

Mas será que é realmente preciso mentir?
Mentir dá remorso.
E não mentir é um dom que o mundo não merece.




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14 de novembro de 2008

just talk

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O que você faz quando um cara do seu cursinho te diz: “mas você senta sozinha, não conversa, não desce pro recreio e não aproveita nenhum tempinho livre entre as aulas pra ficar fazendo exercício e ainda está com matéria atrasada?!”?

a) fala pra ele que vida de vestibulando é assim mesmo, tem que se dedicar, fazer alguns sacrifícios.
b) reclama que é muita matéria, que o louco do coordenador colocou um zilhão de aulas à tarde bem no meio da revisão e que ainda tem 106 exercícios de genética extras pra fazer...
c) pergunta pra si mesmo que porra é esta que está fazendo da própria vida, procura o viaduto mais próximo e acaba logo com o sofrimento.
d) manda ele à £#!%¢!.


Ok, eu admito: não é agradável ouvir um comentário desses, você se sente o último dos mortais, o ser mais anti-social do mundo. Tudo bem que sociabilidade nunca foi meu forte, mas acho que dessa vez acabei exagerando. Recordando o dia de hoje, cheguei à conclusão de que o único diálogo verdadeiramente verbal que eu travei foi com meu professor de biologia pra perguntar sobre um exercício de epistasia. Entenda por diálogo verdadeiramente verbal uma conversa com mais de 2 minutos. Os leves acenos de cabeça que eu me esforço para distribuir enquanto subo até o 5º andar todo dia de manhã também não contam como diálogo. Logo eu que sempre gostei tanto de conversar...

A culpa deve ser do cursinho. A culpa TEM que ser do cursinho. Afinal, existe ambiente mais insalubre do que uma sala de extensivo?! Ok, eu admito, de novo: a culpa não pode ser só do cursinho, afinal, tem gente feliz lá, que conversa, que vai pro recreio, que até namora no intervalo [alguns durante as aulas]. Pelo menos eles parecem ser felizes...

Mas agora senti vontade de conversar. Falar besteira, falar das aulas chatas de história, falar que a Oi está sem sinal lá na escola, falar do Milan, contar que a minha mãe comprou outra samambaia... Não quero uma conversa de MSN, e nem um 'e aí, vai chover?'. Graham Bell deve ter inventado o telefone quando estava no cursinho. Mas não, melhor não atrapalhar ninguém com as minhas divagações agora.
Além disso, tenho que revisar mitose e meiose.
Quase como na hora do recreio...
A culpa deve ser mesmo do cursinho.



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12 de outubro de 2008

utopia [?]




Talvez seja querer demais poder saber quem somos, o que queremos, o que sentimos... O máximo que podemos conseguir são vagas impressões, podemos tentar abstrair da confusão do dia-a-dia, das atitudes impensadas e das vontades que vêm do nada o que somos de verdade. Nada vem do nada, então talvez caiba a nós tentar interpretar os ‘sinais’ que a vida dá para tentar descobrir o que ninguém pode nos dizer.


Dizem por aí que homem/mulher deveria vir com manual de instruções, mas eu já não tenho mais a ilusão conseguir entender aos outros, me contento apenas em entender a mim mesma. Um manual poderia até ajudar. Poderia dizer, por exemplo, o que significam os sentimentos errantes, as sensações estranhas, a vontade de chorar, as borboletas no estômago. Também poderia explicar porque a gente faz besteira, uma atrás da outra, depois se arrepende, chora, quer voltar atrás, quer poder dizer a frase certa, o abraço na hora certa e a hora certa de ir embora, bem antes de ter falado tudo o que não devia.


Queria poder saber o que eu quero da vida ou a vida que eu quero. A segurança ou as emoções fortes? As certezas absolutas ou o prazer da dúvida? Fazer sempre a coisa certa ou aprender errando? Voltar cedo para casa ou ficar mais um pouco, só pra ver aonde tudo vai parar? Queria saber a diferença entre o que é certo e o que é melhor para mim. E sabendo, queria ter discernimento e coragem suficiente pra poder escolher. Queria saber se valem a pena os sacrifícios. Queria saber se não é melhor jogar tudo pro alto, trocar o certo pelo duvidoso e dar razão àquela voz lá dentro que vive te dizendo: vai, é isso que você quer.


Queria poder não magoar as pessoas. Queria poder não magoar a mim mesma. Queria ser uma pessoa boa, fazer coisas boas, dizer coisas boas. Queria não usar os outros pros meus próprios objetivos. Queria conseguir não dizer tudo o que vem a mente quando estou nervosa. Queria conseguir não ser óbvia, deixando explícito, escrito na testa que estou arrependida, com raiva ou com ciúmes... Queria poder não ser rude quando na verdade tudo o que quero é um abraço longo, um olhar sincero e um até logo...


Talvez seja querer demais poder saber quem somos, o que queremos, o que sentimos.
Talvez eu queira demais.
E eu nem sei o que quero.



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8 de outubro de 2008

azul royal

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"Às vezes a leitura é um modo engenhoso de evitar o pensamento"

Arthur Helps




Descobri que ler diminui um pouco a crise de consciência por não estar estudando. Além disso, talvez a principal razão para o surto bibliográfico dos últimos tempos seja o fato de que enquanto leio não tenho tempo pra pensar. Eu sei que ler é uma atividade essencialmente mental, mas ocupar a mente com uma informação pronta me exime o peso do pensamento livre. Sim, peso. Cinco minutos de liberdade imaginativa têm a incrível capacidade de levar a uma verdadeira crise existencial. Pensar enlouquece.

Outro aspecto interessante é como o fator estético influi na minha leitura. Ontem mesmo devolvi um volume de Sagarana que havia pegado no mesmo dia, simplesmente porque achei que o livro não combinava com o livro. Aquela capa marrom desbotada simplesmente não condizia com a imagem que eu tinha dos contos de Guimarães – o sertão para mim tem cores mais vibrantes, tanto no vermelho da caatinga quanto no estonteante azul royal do céu. Sim, o céu de Augusto Matraga, na minha imaginação, é azul royal com escassas nuvenzinhas titubeantes e algumas ‘arribações’, que por certo peguei emprestadas de Vidas Secas. Foi aí que descobri que, pra mim, tudo o que está pra cima de Belo Horizonte é Nordeste...

Outra conclusão [brilhante] a que cheguei foi que ler Saramago prejudica a redação. Depois de um livro todo sem parágrafos, sem capítulos marcados e com uma pontuação nada ortodoxa, fica difícil escrever direitinho... E afinal, se ele, escrevendo daquele jeito, ganhou o Nobel de Literatura, quem a banca da Fuvest acha que é pra querer corrigir os pontos, vírgulas e ponto e vírgulas?


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Um dia desses, na contracapa de um exemplar de Morte e Vida Severina, havia uma dedicatória. Era de 67 e pelo jeito o livro havia sido um presente. Apesar da sensação estranha de invasão de privacidade flagrante, é interessante imaginar a história daquele livro, as pessoas que podem tê-lo lido durante esses 40 anos e como ele foi parar na biblioteca da universidade...

Situação parecida acontece com os grifos e anotações dos leitores anteriores. Há também os tickets da própria biblioteca: quem será Carlos Antônio Silveira? Será que foi ele quem deixou o inconfundível cheiro de cigarro nas páginas de 1984? Ou quem será Estela, a senhora mal-humorada do turno da manhã ou a simpática jovem do turno da tarde que sempre dá um jeitinho quando eu me esqueço de devolver os livros?

Isso me faz pensar que um livro carrega em suas páginas duas histórias: a impressa em tinta preta e a que não é impressa, mas deixa suas marcas com o cheiro do fumo, com o grafite do lápis, na antiga dedicatória e no papelzinho amarelo da biblioteca...




Por falar em papelzinho amarelo, da próxima vez vou perguntar o nome da bibliotecária.



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29 de setembro de 2008

Mas, no filtro solar, acredite.

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Não se sinta culpado por não saber o que fazer da vida. As pessoas mais interessantes que eu conheço não sabiam aos vinte e dois o que queriam fazer da vida. Alguns dos quarentões mais interessantes que eu conheço
ainda não sabem.

Mary Schmich






Será que todo mundo sabe o que quer fazer da vida aos 18 anos?
Então porque nos obrigam a fazer essa escolha no fim do Ensino Médio?

E se eu não quiser fazer nada?
Quem foi que ditou essa regra de que TEMOS que fazer um curso superior pra se dar bem na vida? [vide nosso ilustre presidente...]
Quantos são os graduados que nunca exerceram a profissão?
Quantas são as pessoas extremamente bem sucedidas sem possuir um diploma universitário?

E a pergunta mais cruel:
Quem foi que disse que precisa fazer faculdade pra ser feliz?

Eu sei que em um mercado de trabalho concorrido um curso superior te dá ampla vantagem [blá, blá, blá], mas também não dá garantia nenhuma. Quem disse que um engenheiro não fica desempregado? Quem garante que todo médico vai ter trabalho garantido?

Num país de analfabetos, talvez seja um grave equívoco supervalorizar o curso superior e um engano ainda maior entrar na faculdade, concluir o curso e aos 10 ou 15 anos de carreira descobrir que não era nada disso que você queria pra sua vida.



Eu posso ser Oncologista ou ir lavar pratos na Itália.
Quem garante que eu não vou ser mais feliz à beira da pia?



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22 de setembro de 2008

Pneumotórax

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Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico:
- Diga trinta e três.
- Trinta e três... trinta e três... trinta e três...
- Respire.

- O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
- Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
- Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

Manuel Bandeira





Como já diria minha avó, só damos valor na saúde que temos quando não a temos mais. Daria tudo pra nascer de novo, sem pelo menos metade dos problemas de saúde de agora. Ok, não é pra tanto. Mas é o suficiente para o ‘drama nosso de cada dia’ aqui exposto...

Nesses dias descobri que poucas coisas conseguem me deixar mais irritada do que a dor. Talvez perca apenas para as alterações do tipo ‘volante por volante’ do Anchelotti...

Isso sem falar no tempo perdido com os comprimidos, pomadas e compressas de gelo pra diminuir a dor. Dias e dias que poderiam ter sido e não foram.

Sem falar das discussões regadas a lágrimas sobre como eu deveria processar os médicos ou parar de tomar todos os remédios ou então fugir pra Uagadugu* e nunca mais voltar...

E sem falar no telefone desligado de maneira, digamos, abrupta. Pra variar, acabo descontando meus problemas na conta de quem não tem nada a ver com isso.

Bom, vejamos o lado positivo: eu não fui à escola hoje. Ok, eu admito: perdi 13 horas de aulas e tenho a leve impressão de que isso vai me fazer falta um dia... ou seja, devia ter ido à aula, afinal, eu não estou morrendo ainda. AINDA.

Paciência. Não dá pra fazer muita coisa agora. Deixa eu voltar pros meus polinômios...




*Uagadugu: capital de Burkina Fasso


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19 de setembro de 2008

Eu disse e nem assim se pôde evitar.

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ób.vio
adj. 1. Claro, intuitivo, manifesto, patente.

u.tó.pi.co
adj. 1. Que encerra utopia; fantasioso, irrealizável.


óbvio utópico?
sabe-se lá o que o Amarante quis dizer com isso!

Um paradoxo, em essência. Mas a vida não está cheia deles?

óbvios
a saudade,
o medo,
o sono ao fim de um longo dia,
a direção das linhas de força num campo elétrico uniforme,
a morte.

utópicos
a Medicina,
uma vitória do Milan,
a volta dos Losermanos,
resposta certa em exercício de trigonometria,
a vida.


óbvio utópico
mais um [blog] tentando ser alguém na vida...


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